Vou lhes narrar parte de minha vida, memórias de um antigo eu que se
esvaia a cada segundo. Tenho medo de por aqui minhas palavras, já não
estou mais sozinho, algo me observa e eu sei quem é, e logo, vocês
também saberão.
Tudo começou em minha infância, eu era feliz quando criança, animado e
sorridente, longe das sombras da infelicidade e angústia que hoje me
atormenta. Costumava brincar de esconder com meu irmão, éramos
inseparáveis, conosco tinha alguns colegas de classe. Brincávamos todas
as tardes até o anoitecer, meu irmão era indiscutivelmente bom, nunca
era encontrado. Nesta época eu tinha oito anos e meu irmão nove, éramos
apenas criança querendo se divertir ao máximo.
Quando completei dez anos, meu irmão me convenceu de me tornar mais
duro, para me transformar em um verdadeiro homem. Logo comecei a tratar
as pessoas de uma forma diferente. Acabei participando de algumas
brigas, eu sempre apanhava, meu irmão saia ileso. Com cortes e roxos eu
ia sendo arrastado para casa, minha mãe ficava louca.Meu Deus como você
conseguiu andar até aqui, vou chamar seu pai! Meu irmão continuava a me
segurar e falar ele está se tornando um verdadeiro homem nossa mãe
ficava em silêncio.
Os anos se passaram, eu já possuía doze anos e minha mudança continuava,
já não precisava que meu irmão falasse o que tinha de ser feito,
brigava e humilhava todos que não gostava. Arrumei brigas por conta
própria. Comecei a sentir algo diferente, algo bom. Com o passar dos
dias esse sentimento ficou mais forte, muitas vezes parecia me
controlar, já não lembrava com quem tinha brigado, nem o porque, apenas
feria as pessoas sem remorso, sem pena.
Tentando de uma forma drástica que eu melhorasse, meus pais começaram a
me privar de muitas coisas, me tiraram certos privilégios como de sair
de casa e brincar com outros colegas, isso até a minha “fase” como eles
se referiam a minhas brigas passar, mas eu ainda tinha meu irmão, ele
sempre estava comigo, inventávamos muitas coisas juntos, era divertido,
era feliz, era cruel...
Quando completei quinze anos mudei por completo, minha família tentou de
tudo, me levaram ao psicólogo, ao médico e nada resolveu mas eu não
estou doente! Gritava sem parar, me enfurecendo, já não conseguia olhar
para meus pais, sentia raiva, quem mantêm o filho em casa por cinco anos
sem poder sair! Meu olhar agora era de ódio, tudo que via me dava
vontade de bater, quebrar, matar.
Ao completar dezoito anos minha família decidiu me levar para um
hospício. Tentaram me convencer que seria melhor para mim, que eu não
sabia que precisava disso, que não sabia o amor que eles tinham por mim e
choro toda vez que me lembro de minhas ultimas palavras para eles. Esse
lugar me enoja, vocês não merecem ser meus pais, vocês deveriam morrer!
Nesta hora eu apaguei, tudo ficou escuro, mas sentia algo escorrendo em
mim. Ao recuperar os sentidos me deparei com a cena mais horrível de
toda minha vida, não pelo que fiz, mas sim pelo que não senti. Na minha
frente estava meu pai e minha mãe abraçados, um olhar de terror em seus
rostos e escorrendo de suas cabeças. Percebi que segurava algo, uma
faca, uma faca muito grande coberta de sangue. Nada senti, nem remorso
nem pena, nada, e hoje me desespero ao pensar nisso. Ainda olhando meus
pais juntos vejo alguém no canto escuro da casa. Meu irmão estava lá,
com um sinistro sorriso em seu rosto, fiquei encarando ele como se
estivesse hipnotizado. Não demorou muito e a polícia chegou,
provavelmente meus pais gritaram antes de eu... os matar. Logo um dos
policiais me imobilizou, não reagi, apenas fiquei olhando meu irmão no
canto da casa, rindo e pensei porque ninguém viu ele, ele está bem
escondido como sempre?
Ao chegar à delegacia me levaram para interrogatório, fizeram diversas
perguntas. Após duas horas eu finalmente pude perguntar o que me
atormentava. O que aconteceu com meu irmão? Os detetives se olharam
surpresos.Garoto, você não tem nenhum irmão e nunca teve. Meus olhos se
arregalaram com tamanho terror, olhei ao redor zonzo e vi, no canto da
sala, meu irmão dando uma sinistra gargalhada sem som, com um olhar
diabólico em seu rosto e por fim disse a frase que hoje me perturba.
“Eu Apenas Observo O Caos Em Sua Alma Perturbada”
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