A casa sem fim
Deixe-me
começar dizendo que Peter Terry era viciado em heroína. Nós éramos
amigos na faculdade e continuamos sendo após eu ter me formado. Note que
eu disse "eu". Ele largou depois de 2 anos mal feitos. Depois que eu me
mudei do dormitório para um pequeno apartamento, não via Peter com
muita frequência. Nós costumávamos conversar online as vezes (AIM era o
rei na época pré-facebook). Houve um
tempo que ele não ficou online por cinco semanas seguidas. Eu não estava
preocupado. Ele era um notável viciado em cocaína e drogas em geral,
então eu assumi que ele apenas parou de se importar. Mas então, uma
noite, eu o vi entrando. Antes que eu pudesse começar uma conversa, ele
me mandou uma mensagem.
"David, cara, nós precisamos conversar."
Foi quando ele me disse sobre a Casa sem Fim. Ela tinha esse nome pois
ninguém nunca alcançou a saída final. As regras eram bem simples e
clichês: chegue na saída final e você ganha 500 dólares, nove cômodos no
total. A casa estava localizada fora da cidade, aproximadamente 7km da
minha casa. Aparentemente ele tentou e falhou. Ele era viciado em
heroína e sabe lá em mais o que, então eu imaginei que as drogas tinham
feito ele se cagar todo por causa de um fantasma de papel ou algo assim.
Ele me disse que seria demais pra qualquer um. Que não era normal. Eu
não acreditei nele. Por que eu deveria? Eu disse a ele que iria checar
isso na outra noite, e não importava o quanto ele tentasse me fazer não
ir, 500 dólares soava bom demais pra ser verdade, eu precisava tentar.
Fui na noite seguinte. Isso foi o que aconteceu.
Quando eu
cheguei, imediatamente notei algo estranho sobre a casa. Você já viu ou
leu algo que não deveria te assustar, mas por alguma razão te gelava a
espinha? Eu andei através da construção e o o sentimento de mal estar
apenas aumentou quando eu abri a porta da frente.
Meu coração
desacelerou e soltei um suspiro aliviado assim que entrei. O cômodo
parecia como uma entrada de um hotel normal decorada para o Halloween.
Um sinal foi colocado no lugar onde deveria ter um funcionário. Se lia
"Quarto 1 por aqui. Mais oito a seguir. Alcance o final e você vence!"
Eu ri e fui para a primeira porta.
A primeira área era quase
cômica. A decoração lembrava o corredor de Halloween de um K-Mart, cheia
de fantasmas de lençol e zumbis robóticos que soltavam um grunhido
estático quando você passava. No outro lado tinha uma saída, a única
porta além da qual eu entrei. Passei através das falsas teias de aranha e
fui para o segundo quarto.
Fui recebido por uma névoa assim
que abri a porta do segundo quarto. O quarto definitivamente apostou
alto nos termos de tecnologia. Não havia apenas uma máquina de fumaça,
mas morcegos pendurados pelo teto e girando em círculos. Assustador.
Eles pareciam ter em algum lugar da sala, uma trilha sonora em loop de
Halloween que qualquer um encontra em uma loja de R$1,99. Eu não vi um
rádio, mas imaginei que eles tenham usado um sistema de PA. Eu pisei em
cima de alguns ratos de brinquedo com rodinhas e andei com o peito
inchado para a próxima área. Eu alcancei a maçaneta e meu coração parou.
Eu não queria abrir essa porta. O sentimento de medo bateu tão forte
que eu mal conseguia pensar. A lógica voltou depois de alguns momentos
aterrorizantes, e eu abri a porta e entrei no próximo cômodo.
No quarto 3 foi quando as coisas começaram a mudar.
A primeira vista, parecia como um quarto normal. Havia uma cadeira no
meio do quarto com piso de madeira. Uma lâmpada no canto fazia o péssimo
trabalho de iluminar a área, e lançava algumas sombras sobre o chão e
as paredes. Esse era o problema. Sombras. Plural. Com a exceção da
cadeira, havia outras. Eu mal tinha entrado e já estava apavorado. Foi
naquele momento que eu soube que algo não estava certo. Eu nem sequer
pensava quando automaticamente tentei abrir a porta de qual eu vim.
Estava trancada pelo outro lado.
Isso me deixou atormentado.
Alguém estava trancando as portas conforme eu progredia? Não havia como.
Eu teria ouvido. Seria uma trava mecânica que fechava automaticamente?
Talvez. Mas eu estava muito assustado pra pensar. Eu me voltei para o
quarto e as sombras tinham sumido. A sombra da cadeira permaneceu, mas
as outras se foram. Comecei a andar lentamente. Eu costumava alucinar
quando era criança, então eu conclui que as sombras eram um produto da
minha imaginação. Comecei a me sentir melhor assim que fui para o meio
da sala. Olhei para baixo enquanto andava, e foi aí que eu vi. A minha
sombra não estava lá. Eu não tive tempo para gritar. Corri o mais rápido
que pude para a outra porta e me atirei sem pensar no próximo quarto.
O quarto cômodo foi possivelmente o mais perturbador. Assim que eu
fechei a porta, toda a luz pareceu ser sugada para fora e colocada no
quarto anterior. Eu fiquei ali, rodeado pela escuridão, e não conseguia
me mexer. Não tenho medo do escuro, e nunca tive, mas eu estava
absolutamente aterrorizado. Toda a minha visão tinha me deixado. Eu
ergui minha mão na frente do meu rosto e se eu não soubesse que tinha
feito isso, nunca seria capaz de contar. Não conseguia ouvir nada.
Estava um silêncio mortal. Quando você está em uma sala à prova de som,
ainda é capaz de se ouvir respirar. Você consegue ouvir a si mesmo estar
vivo. Eu não podia. Comecei a tropeçar depois de alguns momentos, a
única coisa que eu podia sentir era meu coração batendo rapidamente. Não
havia nenhuma porta à vista. Eu não tinha nem sequer certeza se havia
uma porta mesmo. O silêncio foi quebrado por um zumbido baixo.
Senti algo atrás de mim. Vire-me bruscamente mas mal conseguia ver meu
nariz. Mas eu sabia que era lá. Independentemente do quão escuro estava,
eu sabia que tinha algo lá. O zumbido ficou mais alto, mais perto.
Parecia me cercar, mas eu sabia que o que quer que estivesse causando o
barulho, estava na minha frente, se aproximando. Dei um passo para trás,
eu nunca tinha sentido esse tipo de medo. Eu realmente não consigo
descrever o verdadeiro medo. Não estava nem com medo de morrer, mas sim
do modo que isso ia acontecer. Tinha medo do que a coisa reservara para
mim. Então as luzes piscaram por menos de um segundo e eu vi. Nada. Eu
não vi nada e eu sei que eu não vi nada lá. O quarto estava novamente
mergulhado na escuridão, e o zumbido era agora um guincho selvagem. Eu
gritei em protesto, não conseguiria ouvir o barulho por mais um maldito
minuto. Eu corri para trás, longe do barulho, e comecei a procurar pela
maçaneta. Me virei e cai dentro do quarto 5.
Antes que eu
descreva o quarto 5, você deve entender algo. Eu não sou um viciado.
Nunca tive história de abuso de drogas ou qualquer tipo de psicoses além
das alucinações na minha infância que eu já mencionei, e elas eram
apenas quando eu estava realmente cansado ou tinha acabado de acordar.
Eu entrei na Casa sem Fim limpo.
Depois de cair do quarto
anterior, minha visão do quinto quarto foi de costas, olhando pro teto. O
que eu vi não me assustou, apenas me surpreendeu. Árvores tinha
crescido no quarto e se erguiam acima da minha cabeça. O teto desse
quarto era mais alto que os outros, o que me fez pensar que eu estava no
centro da casa. Me levantei do chão, me limpei e olhei ao redor. Era
definitivamente o maior quarto de todos. Eu sequer conseguia ver a porta
de onde eu estava, os vários arbustos e árvores devem ter bloqueado a
minha linha de visão da saída. Nesse momento eu notei que os quartos
estavam ficando mais assustadores, mas esse era um paraíso em comparação
ao último. Também assumi que o que estava no quarto quatro ficou lá. Eu
estava incrivelmente errado.
Conforme eu andava, comecei a
ouvir o que se poderia ouvir em uma floresta, o barulho dos insetos se
movendo e dos pássaros voando pareciam ser as minhas únicas companhias
nesse quarto. Isso foi o que mais me incomodou. Eu podia ouvir os
insetos e os outros animais, mas não conseguia vê-los. Comecei a me
perguntar quão grande essa casa era. De fora, quando eu caminhei até
ela, parecia como uma casa normal. Era definitivamente na maior parte da
casa, já que tinha quase uma floresta inteira. A abóbada cobria minha
visão do teto, mas eu assumi que ele ainda estava lá, por mais alto que
fosse. Eu também não via nenhuma parede. A única maneira que eu sabia
que ainda estava dentro da casa era por causa do chão compatível com o
dos outros quartos, pisos escuros de madeira. Continuei andando na
esperança que a próxima árvore que eu passasse revelaria a porta. Depois
de alguns momento de caminhada, senti um mosquito no meu braço. O
espantei e continuei. Um segundo depois, senti cerca de dez mais deles
em diferentes lugares da minha pele. Senti eles rastejarem para cima e
para baixo nos meus braços e pernas, e algum deles foram para o meu
rosto. Eu me agitava freneticamente para espantá-los mas eles
continuavam rastejando. Eu olhei para baixo e soltei um grito abafado,
mais um ganido, para ser honesto. Eu não vi um único inseto. Nenhum
inseto estava em mim, mas eu conseguia senti-los. Eu ouvia eles voando
pelo meu rosto e picando a minha pele, mas não conseguia ver um único
inseto. Me joguei no chão e comecei a rolar descontroladamente. Eu
estava desesperado. Eu odiava insetos, especialmente os que eu não
conseguia ver ou tocar. Mas eles conseguiam me tocar, e estavam por toda
parte.
Eu comecei a rastejar. Não tinha ideia para onde estava
indo, a entrada não estava a vista, e eu ainda não tinha visto a saída.
Então eu apenas rastejei, minha pele se contorcendo com a presença
desses insetos fantasmas. Depois do que pareceu horas, eu achei a porta.
Agarrei a árvore mais próxima e me apoiei nela, eu dava tapas nos meus
braços e pernas, sem sucesso. Tentei correr mas não conseguia, meu corpo
estava exausto de rastejar e lidar com o que quer que estivesse no meu
corpo. Eu dei alguns passos vacilantes até a porta, me segurando em cada
árvore para me apoiar. Estava a poucos passos da porta quando eu ouvi. O
zumbido baixo de antes. Estava vindo do próximo quarto, e era mais
profundo. Eu podia quase senti-lo dentro do meu corpo, como quando você
está do lado de um amplificador em um show. O sensação dos insetos em
mim diminuiu quando o zumbido ficou mais alto. Assim que eu coloquei a
mão na maçaneta, os insetos se foram completamente, mas eu não conseguia
girar a maçaneta. Eu sabia que se eu soltasse, os insetos voltariam, e
eu não voltaria para o cômodo quatro. Eu apenas fiquei ali, minha cabeça
pressionada contra a porta marcada 6, minha mão trêmula segurando a
maçaneta. O zumbido era tão alto que eu não conseguia nem me ouvir
fingir pensar. Eu não podia fazer nada além de prosseguir. O quarto 6
era o próximo, e ele era o inferno.
Fechei a porta atrás de
mim, meus olhos fechados e meus ouvidos zunindo. O zumbido me rodeava.
Assim que a porta fechou, o zumbido se foi. Abri meus olhos e a porta
que eu fechei sumira. Era apenas uma parede agora. Olhei em volta em
choque. O quarto era idêntico ao terceiro, a mesma cadeira e lâmpada,
mas com a quantidade de sombras corretas dessa vez. A única real
diferença é que a porta de saída, e a que eu vim, tinham sumido. Como eu
disse antes, eu não tinha problemas anteriores nos termos de
instabilidade mental, mas no momento eu sentia como se estivesse louco.
Eu não gritei. Não fiz um som. No começo eu arranhei suavemente. A
parede era resistente, mas eu sabia que a porta estava lá, em algum
lugar. Eu apenas sabia que estava. Arranhei onde a maçaneta estava.
Arranhei a parede freneticamente com ambas as mãos, minhas unhas
começaram a ser lixadas pela parede. Cai silenciosamente de joelho, o
único som no quarto era o incessante arranhar contra a parede. Eu sabia
que estava lá. A porta estava lá, eu sabia que estava apenas lá, sabia
que se eu pudesse passar pela parede-
"Você está bem?"
Pulei do chão e me virei rapidamente. Me encostei contra a parede atrás
de mim e vi o que falou comigo, e até hoje eu me arrependo de ter me
virado.
A garotinha usava um vestido branco que descia até seus
tornozelos. Ela tinha longos cabelos loiros que desciam até o meio das
suas costas, pele branca e olhos azuis. Ela era a coisa mais assustadora
que eu já tinha visto, e eu sei que nada na vida será tão angustiante
como o que eu vi nela. Enquanto eu a olhava, eu via a jovem menina, mas
também via algo mais. Onde ela estava eu vi o que parecia com um corpo
de um homem maior do que o normal e coberto de pelos. Ele estava nu da
cabeça ao dedão do pé, mas sua cabeça não era humana, e seus pés eram
cascos. Não era o diabo, mas naquele momento poderia muito bem ter sido.
Sua cabeça era a cabeça de um carneiro e o focinho de um lobo. Era
horrível, e era como a menininha a minha frente. Eles tinham a mesma
forma. Eu não consigo realmente descrever, mas eu via os dois ao mesmo
tempo. Eles compartilhavam o mesmo lugar do quarto, mas era como olhar
para duas dimensões separadas. Quando eu olhava a menina, eu via a
coisa, e quando eu olhava a coisa, eu via a menina. Eu não conseguia
falar. Eu mal conseguia ver. Minha mente estava se revoltando contra o
que eu tentava processar. Eu já tive medo antes na minha vida, e eu
nunca tinha estado mais assutado do que quando fiquei preso no quarto 4,
mas isso foi antes do sexto. Eu apenas fiquei ali, olhando para o que
quer que fosse que falou comigo. Não havia saída. Eu estava preso lá com
aquilo. E então ela falou de novo.
"David, você deveria ter ouvido"
Quando aquilo falou, eu ouvi palavras da menina, mas a outra coisa
falou atrás da minha mente numa voz que eu não tentarei descrever. Não
havia nenhum outro som. A voz apenas continuava repetindo a frase de
novo e de novo na minha mente, e eu concordei. Eu não sabia o que fazer.
Estava ficando louco e ainda assim eu não conseguia tirar os olhos do
que estava na minha frente. Cai no chão. Pensei que tinha desmaiado, mas
o quarto não deixaria isso acontecer. Eu apenas queria que isso
terminasse. Eu estava de lado, meus olhos bem apertos e a coisa olhando
pra mim. No chão na minha frente estava correndo um dos ratos de
brinquedo do segundo quarto. A casa estava brincando comigo. Mas por
alguma razão, ver esse rato fez a minha mente voltar de onde quer que
ela estivesse, e olhar ao redor do quarto. Eu sairia de lá. Estava
determinado a sair daquela casa e nunca mais pensar sobre ela novamente.
Eu sabia que esse quarto era o inferno e não estava pronto para ficar
lá. No começo apenas meus olhos se moviam. Eu procurava nas paredes por
qualquer tipo de abertura. O quarto não era muito grande, então não
demorou muito para que eu checasse tudo. O demônio continuava zombando
de mim, a voz cada vez mais alta como a coisa parada lá. Coloquei minha
mão no chão e fiquei de quatro, e voltei a explorar a parede atrás de
mim. Então eu vi algo que eu não podia acreditar. A coisa estava agora
diretamente nas minhas costas, sussurrando como eu não deveria ter
vindo. Eu senti sua respiração na minha nuca, mas me recusei a me virar.
Um grande retângulo foi riscado na madeira, com um pequeno entalhe no
meio dele. E bem em frente aos meus olhos eu vi um 7 que eu tinha
inconscientemente feito na parede. Eu sabia o que era. Quarto 7 estava
bem onde o quarto 5 estava a momentos atrás.
Eu não sabia como
eu tinha feito aquilo, talvez tenha sido apenas o meu estado no momento,
mas eu tinha criado a porta. Eu sabia que tinha. Na minha loucura eu
tinha riscado na parede o que eu mais precisava, uma saída para o
próximo quarto. O quarto 7 estava perto. Eu sabia que o demônio estava
bem atrás de mim, mas por alguma razão, ele não conseguia me tocar.
Fechei meus olhos e coloquei ambas as mãos no grande 7 na minha frente. E
empurrei. Empurrei o mais forte que pude. O demônio agora gritava nos
meus ouvidos. Ele e dizia que eu nunca iria embora. Me dizia que esse
era o fim, mas que eu não iria morrer, eu iria ficar lá no quarto 6 com
ele. Eu não iria. Empurrei e gritei com todo o meu fôlego. Eu sabia que
alguma hora eu iria atravessar a parede. Cerrei meus olhos e gritei, e
então o demônio se foi. Eu fui deixado no silêncio. Me virei lentamente e
fui saudado com o quarto estando como estava quando eu entrei, apenas
uma cadeira e uma lâmpada. Eu não podia acreditar nisso, mas não tive
tempo de me habituar. Me virei para o 7 e pulei levemente para trás. O
que eu vi foi uma porta. Não a que eu tinha riscado lá, mas uma porta
normal com um grande 7 nela. Todo o meu corpo tremia. Me levou um tempo
para girar a maçaneta. Eu apenas fiquei lá, parado por um tempo,
encarando a porta. Eu não podia ficar no quarto 6, não podia. Mas se
isso foi apenas o quarto 6, não conseguia imaginar o que me aguardava no
7. Devo ter ficado lá por uma hora, apenas olhando para o 7.
Finalmente, respirei fundo e girei a maçaneta, abrindo a porta para o
quarto 7.
Cambaleei através da porta mentalmente exausto e
fisicamente fraco. A porta atrás de mim se fechou, e eu me toquei de
onde estava. Eu estava fora. Não fora como no quarto 5, eu estava
realmente lá fora. Meus olhos ardiam. Eu queria chorar. Cai de joelhos e
tentei, mas não consegui. Eu estava finalmente fora daquele inferno.
Nem sequer me importava com o prêmio que foi prometido. Me virei e vi
que porta que eu tinha acabado de atravessar era a entrada. Andei até o
meu carro e dirigi para casa, pensando em o quão bom seria tomar um
banho.
Assim que cheguei em casa, me senti desconfortável. A
alegria de deixar a Casa Sem Fim tinha sumido, e um temor crescia
lentamente em meu estômago. Parei de pensar nisso e fiz meu caminho para
a porta da frente. Entrei e imediatamente subi para o meu quarto. Eu
entrei lá e na minha cama estava meu gato Baskerville. Ele foi a
primeira coisa viva que eu vi aquela noite, e fui fazer carinho nele.
Ele sibilou e bateu na minha mão. Recuei em choque, ele nunca tinha
agido assim. Eu pensei "tanto faz, ele é um gato velho". Fui para o
banho e me aprontei para o que eu esperava ser uma noite de insônia.
Depois do meu banho, fui cozinhar algo. Desci as escadas e me virei
para a sala de estar, e vi o que ficaria para sempre gravado em minha
mente. Meus pais estavam deitados no chão, nus e cobertos de sangue.
Foram mutilado ao ponto de estarem quase identificáveis. Seus membros
foram removidos e colocados do lado dos seus corpos, e suas cabeças em
seus peitos, olhando para mim. A pior parte eram suas expressões. Eles
sorriam, como se estivessem felizes em me ver. Vomitei e comecei a
chorar lá mesmo. Eu não sabia o que tinha acontecido, eles nem sequer
moravam comigo. Eu estava confuso. E então eu vi. Uma porta que nunca
esteve lá antes. Uma porta com um grande 8 riscado com sangue nela.
Eu continuava na casa. Estava na minha sala de estar, mas ainda assim,
no quarto 7. O rosto dos meus pais sorriram mais assim que eu percebi
isso. Eles não eram meus pais, não podiam ser. Mas pareciam exatamente
como eles. A porta marcada com um 8 estava do outro lado, depois dos
corpos mutilados na minha frente. Eu sabia que tinha que continuar, mas
naquele momento eu desisti. Os rostos sorridentes acabaram comigo, me
seguravam lá onde eu estava. Vomitei novamente e quase entrei em
colapso. E então, o zumbido voltou. Estava mais alto do que nunca,
enchia a casa e tremia as paredes. O zumbido me obrigou a andar. Comecei
a andar lentamente, indo em direção a porta e aos corpos. Eu mal
conseguia ficar em pé, ainda mais andar, e quanto mais perto eu ia dos
meus pais, mais perto do suicídio eu estava. As paredes agora tremiam
tanto que parecia que desmoronariam, mas ainda assim os rostos sorriam
para mim. Cada vez que eu me movia, os olhos me seguiam. Agora eu estava
entre os dois corpos, a alguns metros da porta. As mãos desmembradas
rastejaram em minha direção, o tempo todo os rostos continuavam a me
olhar fixamente. Um novo terror tomou conta de mim e eu andei mais
rápido. Eu não queria ouvir eles falarem. Não queria que as vozes fossem
iguais a dos meus pais. Eles começaram a abrir suas bocas, e agora as
mãos estavam a centímetros dos meus pés. Em um movimento desesperado,
corri até a porta, a abri, e bati com ela atrás de mim. Quarto 8.
Eu estava farto. Depois do que acabara de acontecer, eu sabia que não
tinha mais nada que essa porra de casa pudesse ter que eu não pudesse
sobreviver. Não havia nada além do fogo do inferno que eu não estava
preparado. Infelizmente eu subestimei as capacidades da Casa Sem Fim.
Infelizmente, as coisas ficaram mais perturbadoras, mais terríveis e
mais indescritíveis no quarto 8.
Eu continuo tendo dificuldade
me acreditar no que eu vi na sala 8. De novo, o quarto era uma cópia do
quarto 6 e 4, mas sentado na cadeira normalmente vazia, estava um homem.
Depois de alguns segundos de descrença, minha mente finalmente aceitou o
fato de que o homem sentado lá era eu. Não alguém que parecia comigo,
ele era David Williams. Me aproximei. Eu tinha que dar uma olhada
melhor, mesmo tendo certeza disso. Ele olhou para mim e notei lágrimas
em seus olhos.
"Por favor.... por favor, não faça isso. Por favor, não me machuque."
"O que?" Eu disse. "Quem é você? Eu não vou te machucar."
"Sim, você vai" Ele soluçava agora. "Você vai me machucar e eu não
quero que você faça isso." Ele colocou suas pernas para cima na cadeira e
começou a se balançar para frente e para trás. Foi realmente bem
patético de olhar, principalmente por ele ser eu, idêntico em todos os
sentidos.
"Escute, quem é você?" Eu estava agora apenas a alguns
metros do meu doppelganger. Foi a mais estranha experiência que eu tive,
estar lá falando comigo mesmo. Eu não estava assustado, mas ficaria
logo. "Por que você-?"
"Você vai me machucar, você vai me machucar, se você quer sair você vai me machucar"
"Por que você está falando isso? Apenas se acalme, certo? Vamos tentar
entender isso e-" E então eu vi. O David sentado lá estava usando as
mesmas roupas que eu, exceto por uma pequena mancha vermelha bordada em
sua camisa com um número 9"
"Você vai me machucar, você vai me machucar, não, por favor, você vai me machucar..."
Meus olhos não deixaram o pequeno número no seu peito. Eu sabia
exatamente o que era. As primeiras portas foram simples, mas depois elas
ficaram mais ambíguas. 7 foi arranhada na parede pelas minhas próprias
mãos. 8 foi marcada com o sangue dos meus pais. Mas 9 - esse número era
uma pessoa, uma pessoa viva. E o pior, era uma pessoa que parecia
exatamente comigo.
"David?" Eu tive que perguntar.
"Sim...
você vai me machucar, você vai me machucar..." Ele continuo a soluçar e a
se balançar. Ele respondeu ao David. Ele era eu, até a voz. Mas aquele
9. Eu andei por alguns minutos enquanto ele chorava em sua cadeira. O
quarto não tinha nenhuma porta, e assim como o 6, a porta da qual eu vim
tinha sumido. Por alguma razão, eu sabia que arranhar não me levaria a
nenhum lugar dessa vez. Estudei as paredes e o chão em volta da cadeira,
abaixando a minha cabeça e vendo se tinha algo embaixo dela.
Infelizmente, tinha. Embaixo da cadeira tinha uma faca. Junto com ela
tinha uma nota onde se lia: Para David - Da Gerência.
A sensação em
meu estômago quando eu li a nota foi algo sinistro. Eu queria vomitar, e
a última coisa que eu queria fazer era remover a faca debaixo da
cadeira. O outro David continuava a soluçar incontrolavelmente. Minha
mente girava em volta de questões sem respostas. Quem colocou isso aqui e
como sabiam meu nome? Sem mencionar o fato de que eu estava ajoelhado
no chão frio e também estava sentado naquela cadeira, soluçando e
pedindo para não ser machucado por mim mesmo. Isso tudo era muito para
processar. A casa e a gerência estavam brincando comigo esse tempo todo.
Meus pensamentos, por alguma razão, foram para Peter, e se ele chegou
tão longe ou não. E se ele chegou, se ele conheceu um Peter Terry
soluçando nesta cadeira, se balançando para frente e para trás. Eu
expulsei esses pensamentos da minha cabeça, eles não importavam. Eu
peguei a faca debaixo da cadeira e imediatamente o outro David se calou.
"David," ele disse na minha voz, "o que você pensa que vai fazer?"
Me levantei do chão e apertei a faca na minha mão.
"Eu vou sair daqui."
David continuava sentado na cadeira, mas estava bem calmo agora. Ele
olhou pra mim com um sorriso fraco. Eu não sabia se ele iria rir ou me
estrangular. Lentamente ele se levantou da cadeira e ficou de frente
para mim. Era estranho. Sua altura e até a maneira que ele estava eram
iguais a mim. Eu senti o cabo de borracha da faca na minha mão e apertei
ela mais forte. Eu não sabia o que planejava fazer com isso, mas sentia
que eu ia precisar dela.
"Agora" sua voz era um pouco mais
profunda que a minha. "Eu vou te machucar. Eu vou te machucar e eu vou
te manter aqui" Eu não respondi. Eu apenas o ataquei e o segurei no
chão. Eu tinha montado nele e olhei para baixo, faca apontada e
preparada. Ele olhou para mim apavorado. Era como se eu estivesse
olhando para um espelho. E então, o zumbido retornou, baixo e distante,
mas ainda assim eu o sentia no meu corpo. David olhou mim e eu olhei
para mim mesmo. O zumbido foi ficando mais alto, e eu senti algo dentro
de mim se romper. Com apenas um movimento, eu enfiei a faca na marca em
seu peito e rasguei. A escuridão inundou o quarto, e eu estava caindo.
A escuridão em volta de mim era diferente de tudo que eu já tinha
experimentado até aquele ponto. O Quarto 3 era escuro, mas não chegou
nem perto dessa que tinha me engolido completamente. Depois de um tempo,
eu não tinha nem mais certeza se continuava caindo. Me sentia leve,
coberto pela escuridão. E então, uma tristeza profunda veio até mim. Me
senti perdido, deprimido, suicida. A visão dos meus pais entrou na minha
mente. Eu sabia que não era real, mas eu tinha visto aquilo, e a mente
tem dificuldades em diferenciar o que é real e o que não é. A tristeza
só aumentava. Eu estava no quarto 9 pelo que parecia dias. O quarto
final. E era exatamente o que isso era, o fim. A Casa Sem Fim tinha um
final, e eu tinha alcançado isso.
Naquele momento, eu
desisti. Eu sabia que eu estaria naquele estado pra sempre, acompanhado
por nada além da escuridão. Nem o zumbido estava lá para me manter são.
Eu tinha perdido todos os sentidos. Não conseguia sentir eu mesmo. Não
conseguia ouvir nada, a visão era inútil aqui, e eu procurei por algum
gosto na minha boca e não achei nada. Me senti desencarnado e
completamente perdido. Eu sabia onde eu estava. Isso era o inferno. O
Quarto 9 era o inferno. E então aconteceu. Uma luz. Uma dessas luzes
estereotipadas no fim do túnel. Então eu senti o chão vir até mim, eu
estava em pé. Depois de um momento ou dois para reunir meus pensamentos e
sentidos, eu andei lentamente em direção a essa luz.
Assim que eu me aproximei da luz, ela tomou forma. Era uma luz saindo da
fenda de uma porta, dessa vez sem nenhuma marca. Eu lentamente andei
através da porta e me encontrei de volta onde eu comecei, no lobby da
Casa Sem Fim. Estava exatamente como eu deixei. Continuava vazia,
continuava decorada com enfeites infantis de Halloween. Depois de tudo o
que aconteceu aquela noite, eu continuava desconfiado de onde eu
estava. Depois de alguns momentos de normalidade, eu olhei em volta
tentando achar qualquer coisa diferente. Na mesa estava um envelope
branco com o meu nome escrito nele. Muito curioso, mas ainda assim
cauteloso, juntei coragem para abrir o envelope. Dentro estava uma carta
escrita à mão.
David Williams,
Parabéns! Você chegou ao final da Casa Sem Fim! Por favor, aceite esse prêmio como um símbolo da sua grande conquista.
Da sua eterna,
Gerência
Junto com a carta, tinham cinco notas de 100 dólares.
Eu não conseguia parar de rir. Eu ri pelo que pareceram horas. Eu ri
enquanto andava até o carro e ri enquanto dirigia pra casa. Eu ri
enquanto estacionava o carro na minha garagem, ri enquanto abria a porta
da frente da minha casa e ri quando vi um pequeno 10 gravado na
madeira.
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